Revista O Percevejo online

Corpo Cênico – linguagens e pedagogias

Volume 03 - Número 01 – janeiro-julho 2011

Editorial

Esta edição do periódico opercevejoonline reúne mais uma vez pesquisadores e artistas que, em seus trabalhos de investigação e/ou de criação, tematizam o Corpo no universo da Cena, nas diversas possibilidades de expressão e cruzamentos de linguagens e nas perspectivas de formação, do ponto de vista do próprio artista e/ou de seus formadores.

Universo extenso, cada vez mais alargado por experiências e indagações que perpassam vários saberes e disciplinas, os artigos aqui apresentados abrangem manifestações artísticas realizadas nos âmbitos das Artes Cênicas e das Artes Visuais, ora representados pela convivência entre Teatro, Dança e Performance, ora pela apreciação de memórias da formação de artistas, em sua diversidade de linguagens.

Os textos publicados no corpo das sessões guardam uma duplicidade de linguagens por, em sua maioria, reproduzirem versão impressa de palestras apresentadas no I Seminário Internacional Corpo Cênico – linguagens e pedagogias, realizado na Escola de Teatro da UNIRIO, Rio de Janeiro, durante o período de 12 a 16 de setembro de 2011, organizado pelas Profas. Dras. Enamar Ramos, Joana Ribeiro da Silva Tavares e Nara Keiserman, do Grupo de Pesquisa Artes do Movimento. A edição preservou, de algum modo, o caráter próprio à comunicação oral, presente nas falas pronunciadas. Esse caráter de oralidade marca também, é claro, a linguagem da entrevista que Juliana Carneiro da Cunha concedeu a Joana Ribeiro da Silva Tavares em Paris, no ano de 2005.

Esses textos convivem com aqueles elaborados para publicação, como os que foram recebidos a partir da chamada pública. A distribuição dos textos pelas sessões segue a ótica de abordagem do tema.

Abrindo as sessões, a denominação de corpo cênico, aparentemente generalista, abriga adequadamente as contribuições de duas artistas pesquisadoras da França. Charlotte Riom traz um olhar raro sobre a Dança, abordando a sua relação não só com a música, mas principalmente com as cores que constroem a visualidade da cena e passam a se constituir uma linguagem própria, uma dramaturgia visual articulada aos demais elementos. Christine Roquet coloca em discussão noções como o exercício de um pensamento do gesto, para chegar à abordagem sistêmica do gesto expressivo, fundamentando, para o bailarino pesquisador, o gesto e o discurso sobre o gesto.

A sessão processos e métodos de criação traz dois autores parceiros de longa data, em jornadas que incluem a produção de espetáculos teatrais e outras. Nara Keiserman e Luis Artur Nunes contribuem com reflexões que desvelam o trabalho de criação da cena teatral. A primeira, ficcionalizando uma experiência atorial no universo brechtiano, revela quase miudezas da artesania da cena épica. Nunes, traçando sua trajetória num teatro que privilegia o corpo em movimento, aproximando-se francamente da Dança, descreve com minúcias os movimentos dançados não só dos seus atores, ele próprio investido algumas vezes neste papel.

No segmento pedagogias do corpo, transparecem a complexidade e multiplicidade de abordagens manipuladas pelos pesquisadores que desempenham a função formativa. Chama atenção, nos textos de Jean Paul Bucchieri, Jacyan Castilho, Márcia Strazzacappa e Enamar Ramos, a profissão de fé declarada nas linhas ou entrelinhas. Se não há qualquer intenção impositiva, de estratégia infalível a ser adotada, é clara a determinação e aposta na opção pedagógica que investigam, cujos resultados produtivos podem atestar. Na diversidade, o traço comum: o empenho e a generosidade na relação com o outro, sendo este o aluno artista ou o artista pedagogo.

Análise de obras aporta as pesquisas de Bya Braga, sobre aspectos do trabalho de Étienne Decroux; de Beatriz Cerbino, em artigo de divulgação sobre Jaques Corseuil e a crítica de dança no Brasil; e de Márcia Almeida, sobre a noção judaico-cristã do corpo e seus afetos plásticos na dança contemporânea, trazendo à tona discussões sobre diferentes paradoxos produtivos para a elaboração de um pensamento contemporâneo sobre a corporeidade. Os três artigos, numa visada relacional, se interpenetram em questões ligadas ao corpo como lugar em que se opera simultaneamente a construção e o espelhamento da ética; a discussão urgente que tangencia uma historiografia do gesto na arte.

A quarta parte inaugura uma nova sessão, denominada ensaios livres, aberta às reflexões analítico-críticas sobre questões ou obras da contemporaneidade. Não por acaso, temos a palavra de dois jovens pesquisadores, que tratam de novas mídias (Manoel Friques) e de novas cenas (Marcio Freitas). No exercício da análise de realizações teatrais e performáticas recentes, problematizam o discurso cênico, confrontando conceitos como produção de imagens e produção de presença.

Finalmente, há as sessões em que se publicam traduções, além da sessão dedicada à entrevista. Neste número, Ana Bevilaqua, Márcia Moraes e Michele Minnick traduziram o artigo O ator como atleta das emoções: o rasaboxes, de Michele Minnick e Paula Murray Cole, originalmente publicado no periódico Movement for Actors, em 2002. Técnica de treinamento do performer baseada na emoção, criada por Richard Schechner e desenvolvida pelas autoras, o rasaboxes é abordado nas duas instâncias, de formação e de aplicação na composição de personagens e de ações performáticas. Entrevistada por Joana Ribeiro da Silva Tavares, Juliana Carneiro da Cunha, atriz do Théâtre du Soleil, de Ariane Mnouchkine, onde atua desde 1990, partilha com o leitor sua sabedoria sensível advinda de experiências como atriz e bailarina, vivenciada com artistas fundamentais como Maria Duschennes e Klauss Vianna, no Brasil, e ainda Maurice Béjart, Pina Bausch, Maguy Marin e Robert Wilson, entre outros.

Agradecemos aos artistas-pesquisadores que atenderam ao chamado do Grupo de Pesquisa Artes do Movimento para participar como palestrantes no I Seminário Internacional Corpo Cênico, assim como aos demais autores, cujos textos presenteiam os leitores estudiosos do Corpo na Cena com indagações e assertivas portadoras de potência crítica fundamentais para manter e ativar a efervescência criadora em nossa área.

A todos, bom proveito!

 

Nara Walldemar Keiserman e Joana Ribeiro da Silva Tavares – editoras especiais

Ana Maria Bulhões – editora executiva

Paulo Merísio – editor Coordenador do PPGAC