DA PEDAGOGIA DO ATOR À PEDAGOGIA TEATRAL: VERDADE, URGÊNCIA, MOVIMENTO 1
FROM THE
ACTOR’S PEDAGOGY TO THEATRICAL PEDAGOGY: TRUTH, URGENCY, MOVEMENT
Resumo
Este texto discorre sobre o movimento de
passagem da Pedagogia do Ator a Pedagogia Teatral. Discute a Pedagogia Teatral
hoje e sua promessa de transformação dos indivíduos a partir da análise de
alguns movimentos emergentes no teatro do século XX. Especifica a centralidade
da situação pedagógica como protagonista desse discurso. Problematiza a
banalização da improvisação teatral, a emergência do diretor-pedagogo e as
configurações da comunidade teatral como “movimentos” que tornaram possível as
práticas discursivas da Pedagogia Teatral.
Palavras-chave | teatro | pedagogia do ator | pedagogia teatral | discurso | verdade
Abstract
The text discusses the passage from the actor’s
pedagogy to theatre pedagogy. It argues about the promises of theatre pedagogy
to make life human better nowadays, from the perspective of some ideas and
theatre trends in 20th century. It intends also to analyze the
process that makes the pedagogy the basis of this discourse, as well as the
emergence of master-director and the theatre groups as a kind of theatre trend,
which develops some discursive practices on theatre pedagogy.
Keywords | theatre |
actor’s pedagogy | theatre pedagogy | discourse | truth
Pensar o
território da Pedagogia Teatral – ou Pedagogia do Teatro – constitui algumas
dificuldades metodológicas de diferentes ordens. A primeira, e provavelmente a
mais fundamental, é o problema da delimitação de uma ordem discursiva que
poderíamos chamar verdades teatrais. As “antropologias do teatro”, na
segunda metade do século XX, subsidiaram as idéias de que tratar como “teatro”
todas as manifestações culturais nas quais os seres humanos se dão a ver de um
modo fictício e intencional, seria persistir e assumir um ponto de vista
bastante etnocêntrico, uma vez que o que chamamos “teatro” é tão somente um
tipo de manifestação humana espetacular (PRADIER, 1996). Dessa forma, uma
“Pedagogia Teatral” não é senão uma verdade construída dentro de nosso modelo,
ou melhor dizendo, de nosso modo próprio de falar sobre as coisas - e falar
aqui não é uma operação inocente e objetiva da consciência, mas constitui uma
posição no campo discursivo que implica alguns perigos e marca a posição de
quem fala no jogo do verdadeiro e do falso (FOUCAULT, 2005).
Uma segunda
dificuldade é que esse jogo do que é ou não teatro se espraia no jogo de
verdades sobre o que ensinar, o que aprender e como essas tarefas podem ter
êxito. Se o teatro é um ambiente movediço, disperso, partido, descontínuo, a
sua pedagogia, ou uma suposta pedagogia, uma desejável ciência do ensinar e
aprender teatro, se torna objeto difícil de ser delimitado, enquadrado e retido
nas fronteiras de uma arte que insiste em mudar. Com efeito, o teatro não
assume um movimento lento, contínuo e calmo, mas mudanças marcadas na diferença
em si das próprias práticas teatrais. Tão diversas são as formas de fazer que o
modo de dizê-las precisa se esgueirar na tênue silhueta de um contorno borrado,
diluído. O que é mesmo “teatro”? O que se pode entender por ensinar “teatro”?
A terceira
dificuldade, dentre outras tantas possíveis de serem elencadas, diz respeito à
gênese da Pedagogia Teatral: o processo que fez do teatro uma urgência para as
práticas sociais de humanização. Por diferentes caminhos tornou-se verdade
entre nós que, ensinar teatro, ensina a ser cidadão, ensina a ser um bom aluno,
ensina a viver melhor, ensina a ter um objetivo na vida, ensina a não ser
violento, enfim, ensina a ser humano e completo, por intermédio das práticas
criativas isomorfas às práticas profissionais de teatro.
Nesse sentido,
o teatro tem se apresentado sob a forma pedagógica em ambientes tão diferentes
quanto empresas, igrejas, associações, ONGs, escolas, presídios, hospitais; o
que quer dizer que a forma privilegiada de sua presença, com vistas a esses
processos de humanização não é o espetáculo, mas a situação pedagógica.
Para não
pensar, então, o campo da Pedagogia Teatral como uma verdade absoluta,
imutável, se impõe nesse raciocínio a busca de inventariar as condições de
emergência que possibilitaram a existência, no nosso meio, do que chamamos de
Pedagogia Teatral. Como foi possível esse movimento que circunscreveu espaço
suficiente para as práticas do ator – e em grande parte para as práticas e
procedimentos teatrais de modo geral – transcenderem o espetáculo e serem usadas em distintos
ambientes e com distintos propósitos. Algumas dessas condições não partiram de
espetáculos exemplares para a pedagogia, mas da situação pedagógica do ator, na
forma de laboratório – do qual emanaram conhecimentos teatrais suficientes para
as mudanças pretendidas, para o espetáculo, e também, como condições para a
existência do que conhecemos como Pedagogia Teatral. Isso, entretanto, não
configura um abandono do espetáculo, mas a sua inclusão, como já sinalizada, em
contextos e com propósitos bem distintos. Vemos, assim, a passagem da Pedagogia
do Ator – como intenção e prática de melhorar a eficiência da atuação no seio
dos espaços criativos e inventivos do teatro no século XX –, para a Pedagogia
Teatral – como urgência de humanização dos sujeitos na vida contemporânea, por
intermédio das práticas teatrais. Cabe por isso indagar: como foi possível a
Pedagogia do Ator, tal qual a idealizada por Stanislavski,
Copeau, Decroux e outros
“reformadores do teatro”, se tornar uma Pedagogia Teatral, amplamente difundida
e generalizada em espaços diferentes e com propósitos distintos e para além do
espetáculo?
A situação pedagógica: para transformar o
espetáculo ou para mudar os indivíduos?
Parece ter
sido a situação pedagógica, e não tanto os espetáculos, que fundamentou alguns
movimentos do teatro euro-americano, nos quais estão implicadas situações que
revelam a dinâmica e as relações indissociáveis entre o artístico e o
pedagógico.
Para Cruciani (1995), foi a situação pequena, periférica, de
conjunto, que fez as principais rupturas nos modos de fazer teatro no século
XX. Essas rupturas aconteceram em ateliês, escolas e laboratórios. Assim, foram
os estúdios de Stanislavski e Meyerhold,
a escola do Viex-Colombier de Copeau,
o laboratório de Grotowski e uma série de outros
artistas e grupos que, muitas vezes, longe dos grandes centros, isolados,
esquecidos pelo grande público, forjaram as mudanças essenciais da prática do
ator.
Desse
contexto, emergiram mudanças que vemos atravessadas em nossa prática em sala de
aula. Mas quais as condições de sua emergência? Como o ensino de teatro se
subsidiou dessas “verdades”, desses modos ditos “verdadeiros” de fazer, ensinar
e aprender teatro? E que mudanças são essas? Como podemos caracterizá-las e
analisá-las? Para tanto, vou me esforçar em levantar alguns desses movimentos
que vejo implicados nas práticas educativas teatrais no nosso meio e tentar
mostrar a dialética entre o fazer teatro e a situação pedagógica no contexto
plural e singular desses “movimentos”.
Um enunciado
que se faz perceber no discurso contemporâneo da Pedagogia Teatral é a crença,
de muitos modos dita, praticada, falada, escrita, e, por vezes, contradita, de
que a situação pedagógica, antes que o espetáculo, é o lócus
privilegiado para a mudança, para a transformação do humano e para a sua
própria constituição. É a situação pedagógica, ela mesma, protagonista de uma
ruptura com a tradição catártica do teatro. Agora não é mais preciso ver teatro
para viver em si e expurgar de si os males, mas deve-se praticar teatro para
melhor viver. O imperativo da situação pedagógica – que na Pedagogia do Ator
era dita como espaço de exploração e transformação para daí subsidiar mudanças
no espetáculo e melhorar a sua eficiência – é, agora, o centralizador da
mudança. No mundo contemporâneo, na mídia, na escola, na igreja, nos movimentos
sociais, é preciso aprender teatro para melhor viver, para melhor alcançar uma
consciência de si. Mas que situação pedagógica é essa? Que relação ela tem com
a sua origem, com o seu motor, com sua proveniência da Pedagogia do Ator?
Da Pedagogia do Ator à banalização da improvisação
A primeira
idéia que gostaria de compartilhar é a instauração da improvisação no seu status de processo criativo. A idéia de
improvisação sempre esteve no cerne do trabalho teatral. A natureza efêmera do
teatro constitui o plano daquilo que Brook (2002)
nomeia como “o momento presente”. Estar no aqui-agora
e representar ao público, se dar a ver, entregar-se a uma ação presente implica
sempre uma dialética entre o planejado e o realizado no momento. A improvisação
na atuação teatral se sustenta nessa “brecha”, nesse momento de estar presente,
na ludicidade de fazer “como se” com o próprio corpo.
No entanto, no
final do século XIX e início do século XX, vemos emergir um outro sentido para
a improvisação: técnica para a criação. Pouco a pouco, a tradição das récitas, “[...]
herdadas de alguns grandes atores e que são religiosamente transmitidas” (ASLAN, 1994: p. 03), vão dando lugar à
necessidade da originalidade e da organicidade, tão caras ao modernismo e a
repetição do papel – até então tida como instrumento do ator –, vai sendo
substituída pela procura de uma personalização, de uma interpretação do papel.
A improvisação
terá papel fundamental nesse processo como procedimento criativo. Se antes o
aprendiz obtinha o status de ator ao
reproduzir de forma imitativa o mestre, agora o ator haveria de criar, ele
mesmo, uma “versão” para o papel.
Devemos ao Método das ações físicas de Stanislavski (RUFFINI, 2005), como sendo o primeiro
conjunto sistematizado de improvisações, esse legado. Nele o ator russo propõe
uma série de improvisações sobre as circunstâncias do texto e de circunstâncias
fictícias, nas quais o ator deve resolver desafios e completar o universo do
texto. Se essa pretensão de Stanislavski e seus
contemporâneos teve como princípio satisfazer as necessidades de um movimento
artístico específico, ela transcendeu e muito essa origem, se desdobrando como
uma prática discursiva.
No entanto,
como prática discursiva hoje, de certa forma, ela se contrapõe à origem se
generalizando como uma prática rápida. Stanislavski
consagrava um número elevado de ensaios para preparar cada espetáculo. No mesmo
sentido, o trabalho nos laboratórios, sobretudo a aventura quase solitária com
seus atores-alunos dos últimos anos – relatada por Toporkov
(1979) – implicava dedicação, continuidade e muitas horas de trabalho.
Nesse aspecto,
a Pedagogia Teatral costuma se generalizar da Pedagogia do Ator como uma
prática rápida, muitas vezes na modalidade de workshop, com algumas poucas horas. A pretensão de transformação
humana pelo teatro é feita no nosso entorno com a rapidez e a banalização do
nosso tempo e sem o tempo consagrado ao processo tal qual preconizava Stanislavski. Será mesmo possível “transformar” indivíduos
em cidadãos com algumas poucas horas de prática de improvisação?
Do diretor ao guia espiritual
A idéia de um
diretor ou encenador emerge no contexto moderno quando a necessidade de um ensemble, de um conjunto harmonioso, se
coloca. Essa figura irá determinar muitas práticas pedagógicas, pois o diretor
como líder de grupo, como arranjador, orquestrador, fertilizará no âmbito do
fazer teatro.
O encenador
como intérprete do dramaturgo, como leitor e como agregador das idéias de todo
o conjunto artístico teatral surge, assim, e também, para promover com mais
certezas as pretensões realistas. O figurino convencionado, os telões pintados
como cenário e a récita tradicional vão dando lugar a uma visão, a uma
concepção de mundo, de teatro e de encenação – a visão do diretor. Para essa
pretensão de originalidade será necessário um líder.
No entanto,
dois movimentos vão variar essa figura centralizante
e, na sua origem e prática, muitas vezes, autoritária: o diretor-pedagogo e o
líder espiritual (RUFFINI, 2004).
Aos poucos, o
diretor vai se convertendo num diretor-pedagogo, pois a necessidade de
pesquisar ou criar instrumentos para lograr êxito na encenação requer um
ambiente “pedagógico” no qual a pesquisa da linguagem teatral perpassa a
investigação dos atores.
A relação
desse tipo de prática com o ensino de teatro é, por conseguinte, óbvia. Não se
trata de “ensinar” stricto sensu teatro
aos atores alunos, mas de orientar um processo poético no qual se constitua um
modo específico de fazer que atenda antes ao anseio de compreensão do fenômeno
teatral do que o acúmulo de técnicas.
Foi na
situação de diretor-pedagogo que nomes importantes como Stanislavski,
Meyerhold, Copeau, Decroux, Grotowski, Barba,
constituíram modos de fazer e pensar teatro que se poderia nomear como
“condição” de aparecimento da Pedagogia Teatral, tal qual a conhecemos hoje.
Assim, essa situação pedagógica na qual um diretor se propõe a
investigar, numa situação de laboratório, o fenômeno teatral, possibilitou uma
outra mudança: o aparecimento do líder espiritual. Essa figura ainda inusitada
na história do teatro começa a se insinuar quando os procedimentos de
desestabilização das fronteiras entre cena e platéia iniciam. A passagem do
diretor para o líder espiritual acontece na fronteira do questionar do
espetáculo, quando o processo parece mais importante do que o produto, quando
nas décadas de sessenta e setenta, por exemplo, a figura do mestre, do guru,
passa a fazer parte das preocupações teatrais. A saída do teatro para o
para-teatral, no trabalho de Grotowski, mostra
claramente esse movimento.
Mas se o guia-espiritual ou o diretor-pedagogo
se circunscrevem em práticas artesanais, caseiras, por assim dizer – pois
cercadas de segredos e configurando culturas particulares de grupos muito
reduzidos de pessoas, conduzidas por uma figura centralizada a propor processos
que possam causar “transformações” no modo de viver –, essa mesma idéia, ao ser
generalizada para as práticas educativas que se constituem nos ideais
iluministas de universalidade – de que todos devem ter acesso à educação – se
encontra deslocada, transformada, esvaziada de seu sentido. O professor, seja
ele atuante na escola, na ONG ou em movimentos sociais, não pode contar com as
condições idealizadas daqueles diretores-pedagogos, quando muito pertence a um
conjunto de profissionais que, encarregados de “formar” os indivíduos ou de
lhes restituir uma “cidadania perdida” (pelas drogas, pela violência, pela
miséria), trabalha no modelo pedagógico da partição dos conteúdos, da
hierarquização das disciplinas, da divisão das áreas de saber, das práticas de
especialização, do fracionamento dos temas; longe,
portanto, da totalidade de conhecimento que o processo de criação de um
espetáculo costuma propor.
Do grupo de teatro à comunidade teatral
O grupo de
teatro ou companhia teatral entendida como organização institucionalizada,
burocrática e, algumas vezes, empresVerdana continua existindo desde que esse
sistema se fez engendrar a partir do aparecimento e consolidação da burguesia
capitalista.
No entanto, um
movimento significativo faz aparecer uma organização de outra natureza: a
comunidade teatral. Esse tipo de agrupamento faz uma outra significativa
mudança, a passagem da simples criação para a condição criativa.
Segundo Ruffini (2004), a condição criativa corresponde a um estado
propício para a criação, em oposição a simples reunião de artistas para a
realização de um espetáculo. A comunidade teatral relega, sem negar, o
espetáculo a uma parte da condição criativa, não centralizando nele o ponto
fundamental do teatro. Assim, diversos grupos de teatro se converteram, no
século XX, e ainda hoje, em verdadeiras comunidades teatrais nas quais as
singularidades identitárias, tanto de cada ator como
de cada grupo, são não só autorizadas, como sublinhadas.
A comunidade
teatral, em geral, centraliza no ator as tarefas teatrais que antes eram
assumidos por uma equipe interdisciplinar e faz da convivência e do fazer
teatro um modo de vida. A idéia de uma condição criativa se desdobra na
situação pedagógica, ao mesmo tempo em que dela surge, como condição de
emergência para os sujeitos criarem suas respectivas identidades teatrais.
No nosso
entorno, num tempo no qual a individualidade tem sido um valor, quando cuidar
de si parece estar relacionado apenas ao cuidado do eu, viver em comunidade,
compartilhar com o outro, pode ser um desafio intransponível. O discurso da
Pedagogia Teatral, com efeito, promete essa experiência, essa inter-relação com
o Outro, da qual resultaria, segundo os enunciados desse discurso, um movimento
de abertura, de solidariedade. Mas que possibilidade de relação comunitária o
teatro e sua pedagogia podem oferecer realmente? Como a recuperação desses
ideais de comunidade teatral são acolhidos no seio de projetos organizados sob
a égide da pressa, da retenção de gastos, da universalização dos saberes?
Uma
alternativa ainda mais simples, sem a qual fica difícil imaginar o que
concebemos como teatro, se traduz na formação do ensemble, do conjunto,
do bando, do grupo. Essa abordagem que traz consigo a idéia de uma comunidade,
que ainda que não viva junta de forma cotidiana, deveria presencialmente
compartilhar muito tempo junto. Ainda essa possibilidade – uma simplificação da
comunidade teatral - se esvaece na contemporaneidade e torna-se espelho apagado
e irrefletido de um ideal modernista de renovação, por intermédio do qual
homens como Stanislavski, Copeau,
Decroux e tantos outros, pensaram e, sobretudo,
praticaram teatro.
A comunidade
teatral pensada e elaborada de tão diversas formas para contemplar na Pedagogia
do Ator a transformação do humano, parece se espraiar para práticas do tipo
“bancárias”, prescritivas e homeopáticas, tal qual emerge do plano discursivo
da Pedagogia Teatral hoje.
Para pensar novas condições e movimentos
As dimensões
deste texto não permitem me alongar na descrição dos movimentos, pois poderia,
ainda, analisar a passagem do ensinar cumulativo à via negativa; do palco à
italiana ao espaço diversificado do teatro de hoje ou a transformação da
atuação “natural” em atuação orgânica; no entanto, os exemplos de movimentos
acima expostos parecem suficientes para compreendermos as condições de
emergência da Pedagogia Teatral.
Aparentemente
são nas mudanças, nas passagens, nas rupturas, nos movimentos, nas formas
distintas e “novas” de fazer e pensar teatro que a aquilo que chamamos de
Pedagogia do Ator foi se engendrando, se disciplinando, se constituindo como um
discurso e uma prática verdadeira. Com efeito, ela se insinua nessa
transcendência do espetáculo, nesse espaço, nesse locus, nesse entre-lugar,
na fissura na qual transborda. É o movimento que possibilita a Pedagogia
Teatral.
O movimento,
no entanto, que fez da Pedagogia do Ator – como prática discursiva emergente no
trabalho dos diretores-pedagogos do século XX (Stanislavski,
Copeau, Decroix, Grotowski e outros) – a condição de emergência para a
generalização da Pedagogia Teatral, se faz sentir na urgência do teatro como
forma de humanização, como forma e como promessa de melhor viver.
Dessa verdade,
que o teatro pode melhorar a vida de seus praticantes, pode-se supor o
movimento anônimo do qual o teatro é protagonista; movimento que perpassa
histórica e socialmente as práticas, os discursos; movimento que rompe, que se
desfaz, que cessa e volta a andar; movimento que se dispersa no dizer de muitos
e de ninguém.
Que condições
seriam necessárias hoje para a Pedagogia Teatral lograr, então, sua promessa?
Transformar os sujeitos? Não seria esse o desafio a ser cercado?
1 Uma versão reduzida deste texto, sob o título de Apontamentos para
pensar as condições de emergência da pedagogia teatral, foi apresentada
como comunicação na IVª Reunião Científica da ABRACE,
em Belo Horizonte, em 2007.
Referências
ASLAN, Odete. O ator no século XX. São Paulo:
Perspectiva, 1994.
BROOK, Peter. A porta aberta. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2002.
CRUCIANI, Fabrizio. Registi pedagogui ecomunità teatrali nel novecento.
Roma: Editori Associati, 1995.
FOUCAULT, Michel. A
arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.
LEABHART, Thomas. Modern
and post-modern mime. Londres: Macmillan,
1989.
PRADIER, Jean-Marie. Ethnoscénologie: la profondeur des émergences. Internationale de l’imaginaire. La scène
et la terre.
Paris: Maison des cultures du monde, n° 5, p.13-42, 1996.
RUFFINI, Franco. Stanislavskij e o “teatro laboratório”. Revista da FUNDARTE. Montenegro. Fundarte. Vol. IV, n. 08, p.04-15, jul./dez. 2004.
___ Stanislavkj. Roma: Editori Laterza, 2005.
TOPORKOV, Vasily O. Stanislavski in
rehearsal: the final years. New York: Arts Books, 1979.
GILBERTO
ICLE é ator, diretor e professor de teatro. É graduado em Artes Cênicas, mestre
e doutor em Educação pela Universidade Federal do RS. É professor Adjunto no
Departamento de Ensino e Curriculo e no Programa de Pós-graduação em Educação (mestrado e doutorado) da mesma
Universidade. É coordenador do curso de especialização em Pedagogia da Arte na
UFRGS. É editor associado da Revista Educação & Realidade e coordenador do GETEPE-Grupo de estudos em educação, teatro e peformance, no qual dirige, também, a UTA-Usina
do Trabalho do ator, grupo de pesquisa e produção de espetáculos. É autor de
diversos artigos no Brasil e exterior e dos livros: Teatro e Construção de
Conhecimento, pela Editora Mercado Aberto; O ator como xamã, pela Editora Perspectiva e Pedagogia Teatral
como cuidado de si, no prelo da Editora Hucitec.
GILBERTO
ICLE, PHD is an Assistant Professor
of Theater for the Post Graduation Program at the Federal University of Rio
Grande do Sul – UFRGS. He is
an actor, theater director, and coordinator of GETEPE - Education, Theater, and
Performance Study Groups, where he is also an actor and director of UTA -
Actor’s Work Factory. Gilberto is the Associate Editor of the Educação &
Realidade Magazine (UFRGS), author of various articles
in Brazil and abroad, and the
books Teatro e construção de conhecimento
(Mercado Aberto), O ator como xamã (Perspectiva) and Pedagogia Teatral como cuidado de si (Hucitec).