ESCOLA ANGEL VIANNA – UMA ESCOLA
“EM MOVIMENTO”
ANGEL
VIANNA SCHOOL – A SCHOOL “IN MOTION
Joana Ribeiro da Silva
Tavares
(Unirio)
Voar é para os pássaros, os sonhadores e as
nuvens. Mas, quando os sonhadores assumem a posição de professores e conseguem
transmitir suas idéias e conceitos a ponto de transformá-los em movimentos
conscientes, seus alunos sentem-se pássaros. Seus espíritos chegam às nuvens
(VIANNA, 2001).
Resumo
O artigo apresenta a
escola Escola Angel Vianna, pioneira na formação de
bailarinos e terapeutas corporais, a partir da trajetória dos coreógrafos Klauss Vianna (1928-1992) e Angel Vianna (1928), nos quais
se reconhece a origem de uma pedagogia transversal e pluridisciplinar
em dança, que remonta à escola fundada na década de 1950, em Belo Horizonte
(MG). Analisa as fases posteriores, que inclui um intermezzo em Salvador (BA),
nos anos 1960 (Escola de Dança da UFBA), até a criação da Faculdade Angel
Vianna (RJ, 2001) e revela o perfil de uma escola em constante movimento,
comprometida com a experiência do novo.
Palavras-chave | Escola Angel
Vianna | Klauss Vianna | pedagogia da dança |
preparação corporal
Abstract
The article
presents Angel Vianna’s School as a pioneering
graduation center for contemporary dance and therapy and a reference in the
history of modern dance in Brazil. It shows the development of Klauss Vianna (1928-1992) and
Angel Vianna (1928), and their transversal and
multidisciplinary method of teaching dance, from their start, in the 1950's in
the Minas Gerais state in the south-east region of
Brazil, until the foundation of Angel Vianna
Faculty in 2001, after an interval teaching at the dance department of the
University of Bahia in the 1960's.
Keywords
| Angel Vianna School | Klauss Vianna | dance pedagogy |
movement research
Durante uma aula inaugural ministrada
na Faculdade Angel Vianna em 2004, perguntei aos alunos quais eram suas
expectativas em relação àquela escola. Uma resposta chamou minha atenção de
imediato: – Eu vim para a Escola Angel Vianna, porque aqui é o lugar do novo e
da experimentação. Ao que respondi: – É verdade, e isso há trinta anos.... Mas
o que mantém essa escola aberta e em contínua experimentação?
Tratar da Escola
Angel Vianna significa tratar da família Vianna, e retomar os traços de um
projeto de pedagogia em dança moderna brasileira, originado nos anos cinqüenta
do século passado. Maria Ângela Abras, hoje conhecida como Angel Vianna, nasceu
em Belo Horizonte em 1928, e iniciou sua formação em balé clássico na década de
quarenta com Carlos Leite,1 um dos primeiros professores desta técnica em Minas Gerais. Fascinada
pelas artes, Angel Vianna estudou igualmente
piano com o italiano Francisco Masferrer e escultura
na Escola de Belas-Artes,2 dirigida
pelo pintor Alberto da Veiga Guignard (1896-1962), na qual se formou toda uma
geração de artistas modernistas em Minas Gerais.
O Balé Klauss Vianna – nascimento da pedagogia transversal e pluridisciplinar em dança
O projeto pedagógico desenvolvido por
Angel Vianna teve início com seu marido Klauss Vianna
(1928-1992) nos anos cinqüenta em Belo Horizonte, onde o casal estabeleceu seu
primeiro centro de dança – A Escola Ballet Klauss Vianna. Nesta escola, o ensino da dança foi
complementado com disciplinas como a música e a ioga. Esta última possibilitou
a utilização de apoios inusitados do corpo no chão, distintos daqueles
trabalhados até então no balé clássico, que privilegiava a postura ereta.
O casal Vianna
começou também a estudar anatomia na Escola de Odontologia e Farmácia, o que
por sua vez lhes possibilitou trazer para a dança o conhecimento científico do
movimento corporal, enquanto a relação entre a música e a dança era
particularmente trabalhada com uma professora de música. Esta pluridisciplinaridade, característica da Escola e Faculdade
Angel Vianna nos dias atuais é reconhecida neste projeto pioneiro e pode ser
analisada se levarmos em conta a participação dos Vianna num grupo batizado de
“Geração Complemento”3 – formado
por escritores e artistas. Complemento4
foi também o nome da revista literária criada por intelectuais vanguardistas da
época, substituindo as precedentes, Edifício e Vocação. Com relação às anteriores, a geração Complemento se
distinguiu pela interdisciplinaridade, com cada participante “dentro da sua
profissão, dando incentivo ao outro” (VIANNA, 1999). Conforme a ex-bailarina Duda Machado:
Foi um renascimento em Minas de tudo o que se referia às artes. Foi uma geração totalmente de vanguarda, na literatura, na dança, no teatro e nas artes plásticas. Era um grupo muito interligado, que discutia e realizava em conjunto várias atividades, salientando todo o potencial intelectual e artístico mineiro (MACHADO, 10/07/1988: p. 07).
Para os Vianna,
esta atmosfera intelectual e artística repercutiria ainda na companhia de Ballet Klauss Vianna,
oficializada em 1959, com os discípulos daquela primeira escola. Inicialmente
de inspiração neoclássica, as coreografias de Klauss
Vianna atravessaram outros territórios como a literatura, a música concreta, o
teatro e as artes plásticas, produzindo coreografias inovadoras para a época.
Neste sentido, a coreografia O caso do vestido,5
inspirada no poema homônimo de Carlos Drummond de Andrade, recitado ao vivo
pelos atores do grupo “Teatro Experimental”,6
foi uma obra de referência.
O projeto
pedagógico, bem como a obra dos Vianna foi em seguida, apreciado pelo
coreógrafo Rolf Gelewsky,7 discípulo de Mary Wigman, que reconhecendo
neles traços da modernidade, convida o casal para trabalhar na Escola de Dança
da Universidade da Bahia – primeiro curso superior de dança criado no Brasil,
em 1956. A estadia de dois anos em Salvador enriqueceu o conhecimento em
disciplinas como música e anatomia, além proporcionar contacto com a capoeira,
o ritual do candomblé e o sistema Laban. Quando volta
da Bahia, o casal se instala no Rio de Janeiro, retomando seu próprio projeto
pedagógico.
Os Vianna no Rio
de Janeiro – “Os intelectuais da dança”
É no Rio de
Janeiro, que o casal Vianna vai atuar em áreas diversas e desenvolver um
projeto pedagógico em constante transformação, a partir de 1965. Eles ensinam
inicialmente, o balé clássico, mas são requisitados também pelo teatro, quando Klauss Vianna assina a coreografia, com o auxílio da
bailarina Angel Vianna, da montagem de A
Ópera de três vinténs8 em 1967, de Bertolt Brecht e Kurt Weill.
Esta experiência abriu as portas para um novo modo de trabalhar o corpo do
ator. Os Vianna perceberam que era necessário enfocar os fundamentos do
movimento, através de um método de sensibilização corporal, ao invés de coreografar
com base em técnicas codificadas como o balé clássico, uma vez que a maior
parte do elenco não tinha formação em dança. Para tanto, foram explorados
elementos de seus estudos tais como a percepção óssea, a propriocepção,
a improvisação e o ritmo.
Identificados
no início dos anos setenta como professores de “expressão corporal” os Vianna
foram convidados, inúmeras vezes, para intervir como coreógrafos no meio
teatral. Esta pedagogia do corpo específica para atores foi, do mesmo modo,
integrada ao meio da dança e eles ensinaram “expressão corporal” em academias
de dança como o estúdio de Tatiana Leskova.9
O curso começou com trinta alunos, em sua maioria atores e se expandiu a um
público eclético composto de músicos, artistas plásticos e profissionais
liberais, até atingir, aproximadamente, cem alunos. Foi quando o casal
compreendeu a originalidade de seu trabalho e resolveu reabrir sua própria
escola, em 1975.
Reconhecido
nos anos setenta como “corredor cultural da cidade do Rio de Janeiro”, o Centro
de Pesquisa Corporal – Arte e Educação,10 localizado no bairro de Botafogo, na Rua Góes Monteiro, foi o precursor da atual Escola Angel Vianna, na Rua
Jornalista Orlando Dantas.
Denominados na época como “intelectuais da dança”, uma vez que seus conceitos
ultrapassavam o meio da dança de cena que se costumava fazer no Rio de Janeiro,
os Vianna colaboraram com inúmeras instituições.11 Concomitante, o projeto pedagógico com o meio teatral
continuou a ser desenvolvido e uma nova função, “a preparação corporal” do
ator, assinada por Klauss Vianna na montagem da Casa de Bonecas12
em 1971, começava a ser conhecida.
Espaço
Novo – novo centro de
pesquisa em movimento
Resumamos os
principais caracteres de um rizoma: diferentemente das árvores ou de suas
raízes, o rizoma conecta um ponto qualquer com outro ponto qualquer e cada um
de seus traços não remete necessariamente a traços de mesma natureza; ele põe
em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive estados de não-signos. [...]
Ele não é feito de unidades, mas de dimensões, ou antes de direções movediças.
Ele não tem começo nem fim, mas sempre um meio pelo qual ele cresce e
transborda (DELEUZE e GUATTARI, 2004: p. 32).
A escola seguinte, um centro de formação profissional,
foi fundada em 1983 por Angel Vianna, seu filho Rainer
Vianna (1958-1995) e Neide Neves, sob o nome de Centro de Estudos do
Movimento e Artes – Espaço Novo.
Hoje composta pela Escola e Faculdade Angel Vianna, funciona sob quatro
vertentes: os cursos livres de dança e movimento corporal, os cursos de
formação técnica, os cursos de nível superior (3º grau) e a pós-graduação lato
sensu; última etapa alcançada por Angel
Vianna, ela mesmo agraciada com o título de doutor
notório saber13 (2003) pela UFBA. São estes cursos e suas
reverberações na sociedade, tal qual uma rede “rizomática”,
que abordaremos a seguir.
A Escola Angel Vianna – uma rede rizomática da dança
A
Escola Angel Vianna, enquanto um curso de formação profissionalizante oferece
um ensino multidisciplinar com aplicabilidade no meio das artes, da saúde e da
educação. Neste sentido, o aluno pode escolher entre duas formações técnicas de
nível médio: uma de “bailarino contemporâneo”14 e outra em “recuperação motora e de terapia através
da dança” – comparável às formações européias de Psicomotricidade na França, ou Dançaterapia na Suécia.
A
formação técnica em “recuperação motora e de terapia através da dança”
apresenta seu corpus disciplinar composto, entre outros,
por “técnicas somáticas”.15 Observe-se que toda uma geração16 de bailarinos e coreógrafos de dança contemporânea no
Rio de Janeiro, desde os anos oitenta, foi formada pela Escola Angel Vianna.
Isso sem mencionarmos outros pioneiros da década anterior como a uruguaia Graciela Figueroa,17 diretora do grupo Coringa (1977-1985), que participou
do grupo de dança contemporânea Teatro do Movimento,18
criado pelos Vianna no Rio de Janeiro, em 1976.
Muitos
discípulos são hoje formadores de novas gerações e podem ser reconhecidos tanto
no quadro19
de professores da Escola e Faculdade Angel Vianna, quanto em centros de
formação de dança e teatro no Rio de Janeiro. Alguns criaram suas próprias
companhias de dança e outros podem ser encontrados trabalhando fora do Brasil.
Além disso, diversos projetos de criação em dança e teatro contemporâneos foram
e continuam recebendo apoio da escola, por meio de empréstimo de estúdio para
ensaio, como por exemplo a Companhia de Dança Deborah Colker,
nos anos noventa.
Angel
Vianna trabalha o movimento corporal sob aspectos variados, e esta atuação
ultrapassa o domínio da dança. Um exemplo disso é o seu curso de formação
técnica que investiga a recuperação motora através da dança, formando uma
geração pioneira de bailarinos-terapeutas,20 que atuam no domínio da saúde. Inúmeros projetos são
desenvolvidos em centros diversos, como no Hospital da Rede Sarah Kubitschek,
nos quais a técnica de dança e a “consciência do movimento”21 são empregadas como opção de reabilitação de adultos
e crianças portadores de deficiências neurológicas e ortopédicas.
A
Escola Angel Vianna funciona há vinte e cinco anos, sem qualquer subvenção,
ainda que tenha um papel fundamental na formação e no desenvolvimento da dança
contemporânea no Brasil, o que resultou na sua mudança de estatuto para instituição sem fins lucrativos. Se levarmos
em conta a situação sócio-econômica emergente do Brasil, em franco crescimento
e desenvolvimento, a necessidade de aprofundar o estudo e o pensamento sobre a
dança levou Angel Vianna a pedir autorização para criar um curso de formação
superior. Ainda que a cidade do Rio de Janeiro conte nos dias de hoje com três
cursos de formação superior em dança,22 nenhuma pós-graduação stricto sensu, que autorize pesquisas de
mestrado e doutorado em dança, foi ainda implementada.
A Faculdade Angel Vianna e seu corpus interdisciplinar
A Faculdade Angel Vianna aberta no ano 2001 trabalha
com professores de áreas científicas variadas como a física, a psicologia, as
artes cênicas, a educação física e a fisioterapia. Isto revela a diversidade,
onde se privilegia a interdisciplinaridade centrada em três grupos, que
funcionam como laboratórios, a saber: “técnica corporal e composição”,23 “encenação e multimídia”24 e “didática e pesquisa”.25
Trata-se de um período total de três anos para a formação em Bacharel – como
bailarino em dança contemporânea, ou de três anos e meio para a formação em
Licenciatura como professor de dança. A cada semestre, a faculdade apresenta um
work-in-progress, por ocasião de um evento
intitulado MOSTRA, quando os estudantes apresentam seus trabalhos em
andamento. Esta apresentação é co-produzida pela diretoria da Faculdade e um
comitê de estudantes, e ocupa um dos teatros da rede pública carioca, como o
Teatro Cacilda Becker ou o Centro Coreográfico. Outrossim, seminários internos vêm sendo
organizados por professores e alunos, possibilitando a divulgação das pesquisas
desenvolvidas na instituição tanto pelo seu corpo discente, quanto docente. Um
pouco da produção textual dessas pesquisas pode ser encontrado tanto na
publicação Dança e
Educação em Movimento (CALAZANS, CASTILHO e GOMES,
2003) organizada por pesquisadores que se formaram na Escola Angel Vianna,
quanto na revista digital26 da
Faculdade Angel Vianna, criada em 2008.
Do
mesmo modo que a Escola, a Faculdade funciona como um celeiro para a dança, abrigando
a formação de novas companhias de dança contemporânea.27 É curioso observar que entre os estudantes da Escola
e Faculdade Angel Vianna, muitos são atores que buscam um aprofundamento no
estudo do movimento, herança da trajetória dos Vianna no meio teatral. O
progresso dos estudantes pode ser facilmente avaliado: vários alunos, mesmo
durante a formação, são incorporados pelo meio profissional, seja como
bailarino, professor, pesquisador, produtor ou iluminador. Isso sem
mencionarmos aqueles que já são profissionais e buscam na Faculdade, uma nova
especialização.
Ao
término da Faculdade, os estudantes podem continuar seus estudos por meio de
algumas pós-graduações lato-sensu,
implementadas recentemente, onde a diversidade de ofertas ilustra mais uma vez
o caráter interdisciplinar da Faculdade, que oferece atualmente três cursos: Terapia através do Movimento. Corpo e
Subjetivação, que atende a demanda de terapeutas corporais em busca de uma
especialização; Estéticas do Movimento: Estudos em Dança, Videodança e Multimídia, coordenado entre outros, pelo coreógrafo Paulo Caldas, um dos
idealizadores do festival Dança em Foco
(2003) e Especialização em Estudos
Contemporâneos em Dança, fruto da pareceria com a UFBA.
O significante Angel Vianna
Mas
tratar da Escola e Faculdade Angel Vianna significa também mencionar sua
principal mentora: Angel Vianna, cujo nome próprio virou um “significante” para
a Escola – sendo comum ouvir os alunos dizerem que estudam na “Angel”. Grande
empreendedora, Angel, conseguiu edificar não apenas as suas idéias, como também
as de Klauss e Rainer,
marido e filho. Diretora presente, cuida dos mínimos detalhes e difunde na sua
“escola-faculdade” uma atmosfera familiar de casa... como uma extensão de seu
próprio corpo. O que torna possível defender a existência de um “estado Angel
Vianna” – disponibilizando seus freqüentadores para o movimento em comunhão
consigo e com o outro.
Por
isso, se para aquele estudante, cujos objetivos foram relatados no início do
artigo, estudar na Faculdade Angel Vianna é a “experiência do novo”, para o seu
professor significa fazer parte de um “oásis” no meio científico. Como se trata
de um campus pequeno, sob medida humana dirigido por um “mestre” existe a
liberdade necessária para construção de um projeto pedagógico, no qual o
diálogo circula entre os corpos discente, docente e diretor sem
hierarquias. Deste modo, ao invés de concentrar seu “saber-fazer” apenas para si,
tentação que ronda inúmeros artistas-pedagogos, Angel perpetua com generosidade
e inteligência seu conhecimento.
O gesto de ensinar “Vianna” – um ato de amor
O gesto de
ensinar dos “Vianna” é como um ato de amor, em que o aluno é a priori reconhecido
e aceito como indivíduo. Numa analogia com Platão (427 a.C.), verifica-se que a
educação é “como uma atividade erótica, uma obra do amor, que implica numa
relação desinteressada, visando o bem do discípulo e não apenas o prazer do
mestre, permitindo desse modo, que eros vá além dele mesmo” (TAVARES, 1985: p. 101).
Angel reconhece
cada aluno, na memória subjetiva de uma mestra, que conduziu inúmeros corpos,
para em seguida perguntar pelos seus afetos, maridos, namoradas, filhos e
novidades... Ouve com atenção, com os “olhos” de quem sente eterna curiosidade
pelo mundo, para logo em seguida citar sua experiência: “Ah, mas isso eu e o Klauss já fazíamos, há muito tempo”. Age do mesmo modo com
seus professores e assistentes, tramando uma rede multiplicadora, que
possibilita a difusão da dança em diversos domínios. Compreendeu, há muito
tempo, que a dança ultrapassa um estilo pessoal e expande ao outro o acesso ao
“saber-fazer”, contribuindo para seu crescimento.
A
Escola Angel Vianna data do início da pesquisa em dança moderna brasileira,
atravessou a história do teatro e intervém no domínio da saúde e da educação,
gerando um projeto de inclusão e recuperação social pioneiro no Brasil. Fazendo
um paralelo entre o Brasil e alguns países estrangeiros, como França e Estados
Unidos, poderíamos redimensionar a importância dos Vianna, se analisássemos as
trajetórias de outros pioneiros tais como a coreógrafa Anna Halprin28
nos Estados Unidos, ou ainda o casal de bailarinos modernos Françoise e
Dominique Dupuy,29
na França. Mestres que traçaram através de suas vivências e experiências,
inúmeras linhas que compõem a história da dança, propagando-a entre múltiplas
direções, tal qual uma rede “rizomática”. E se o que
nos falta é uma “nomadologie”
(nomadologia) segundo Deleuze e Guattari
(1980, p. 34) – o contrário de uma história – já que escrevemos do ponto de
vista dos sedentários, é necessário reconhecer que Angel Vianna responde por
meio de sua “escola-nômade”, sempre em movimento, ao
problema de transmissão e permanência de sua obra.
Referências
CALAZANS, Julieta. CASTILHO, Jacyan. GOMES,
Simone (Coord.) Dança e Educação em Movimento. São
Paulo: Cortez Editora, 2003.
DELEUZE,
Gilles et GUATTARI, Félix. Mil Platôs. Capitalismo e Esquizofrenia 1. Trad. Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. São Paulo: Ed. 34 ltda.,
2004.
___ Mille
plateaux.Capitalisme et Schizophrénie 2. Paris: Ed. De
Minuit, 1980.
DUPUY,
Dominique et Françoise. Une danse à l’oeuvre. Paris: CND, 2001.
FREIRE, Ana Vitória. Angel Vianna:uma biografia da dança contemporânea. Rio de Janeiro: Dublin, 2005.
MACHADO, Duda e MAGALHÃES, Geraldo. A geração
complemento: Breve história dos anos 50, quando se consumia Ionesco
e os ‘Cahiers de Cinéma’
nas mesas do Alpino. In.: Estado de Minas.
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2007.
REIS, Maria da Glória Ferreira. Cidade e
palco: experimentação, transformação e permanências. Belo Horizonte: Cuatiara, 2005.
TAVARES, Hugo C. da Silva. Introdução
histórica à filosofia. Belo Horizonte: Círculo Psicanalítico, 1985.
TAVARES, Joana Ribeiro da Silva. A técnica Klauss Vianna e sua
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(Dissertação de Mestrado).
___ Klauss Vianna, do coreógrafo ao diretor de movimento – Historiografia da preparação corporal no Teatro Brasileiro. Rio de Janeiro: UNIRIO, 2007. (Tese de
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TEIXEIRA, Letícia. A abordagem
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(Dissertação de Mestrado).
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Antônio de. A dança. São
Paulo: Siciliano, 1990. 1ª ed.
___ A dança. São Paulo: Summus, 2005. 3ª ed.
WORTH, Libby e POYNOR, Helen. Anna Halprin. Inglaterra: Routledge,
2004.
Vídeos e DVDs
“Memória Presente: Klauss Vianna” – CASALI, Eleonora
e NAVAS, Cássia. TV Anhembi. São Paulo: Arquivo Multimeios
do Centro Cultural São Paulo – Midiatéca da
Biblioteca da ECA, 1992.
“Movimento expressivo – Klauss Vianna”. BOGÉA,
Inês e ROIZENBLIT, Sérgio. São Paulo: Miração Filmes,
2004.
“Angel Vianna” – DVD da
Escola e Faculdade Angel Vianna, Rio de Janeiro, s/d.
Sites
www.annahalprin.org
www.tamalpa.org
Notas
1 Carlos Leite (1914-1995) do Rio Grande do Sul, foi aluno de Maria Olenewa (1896-1965), responsável pela primeira escola de
balé clássico no Brasil, no Teatro Municipal da cidade do Rio de Janeiro, sob a
técnica de Vaganova. Carlos Leite foi primeiro
bailarino do Municipal do Rio de Janeiro e do Ballet
da Juventude. No exterior dançou, entre outros, no Ballet Original Russo, com turnês pelos Estados Unidos e Europa. Fundou em
Belo Horizonte a Escola de Dança Ballet Minas
Gerais, hoje incorporada pelo CEFAR – Centro de Formação Artística da Fundação Clóvis
Salgado.
2 A escola de Belas–Artes foi fundada pelo prefeito de Belo Horizonte
Juscelino Kubitschek, na década de quarenta.
3 A Geração Complemento reunia, entre outros, os escritores Ivan Ângelo,
Fernando Gabeira, Silviano Santiago e Henfil, os atores Carlos Kroeber e Jonas Bloch, o maestro Isaac Karabtchevsk,
o crítico de arte Frederico de Moraes, e os bailarinos Klauss
Vianna, Angel Vianna e Décio Otero.
4 Complemento (1956). O nome da revista foi retirado de um
poema de Ferreira Gullar: “Grito, fruto obscuro/ e extremo dessa árvore:
galo./ Mas que, fora dele,/ é mero complemento de auroras”. Apesar de ter
como pólo aglutinador o Centro de Estudos Cinematográficos, o grupo responsável
pela revista definia-se como pluri-artístico. Cada
novo colaborador era recebido como complemento,
mostrando o panorama das artes em Minas na forma de um mosaico. Segundo
Silviano Santiago, a revista funcionava como os suplementos literários e foi
por esta razão que “uma revistinha literária meio rastaqüera e intelectualmente
raquítica conseguiu ser o núcleo inicial e passageiro de uma geração vibrante
de grandes artistas e pensadores que hoje atuam nos vários setores da vida
pública nacional”. In: (REIS, 2005:
pp. 26-7).
5 Para o poema O caso do vestido, de Carlos Drummond de Andrade,
que aborda o tema da traição e do triângulo amoroso, Klauss
Vianna concebeu uma coreografia passada em dois planos. Enquanto no plano real
desenrolava-se a história no tempo presente (os diálogos), no plano imaginário
a narração da ação sofrida era representada. Por isso, as personagens foram
desdobradas e interpretadas por duas bailarinas. Já o figurino aboliu os
“tutus” do balé clássico e adotou collants
e sapatilhas de meia ponta.
6 O Teatro Experimental de Belo Horizonte (1956-1974) foi fundado por
Jota D’Ângelo, Carlos Kroeber e João Marschner. Uma geração autodidata e pioneira, que nasceu do
teatro amador e buscou sua profissionalização, almejando a vanguarda através de
autores como Becket, Ionesco,
e Arrabal. Num segundo momento, após o golpe militar
de 1964, redirecionaram sua dramaturgia, em busca de uma postura politicamente
engajada.
7 Rolf Werner Gelewsky (1930-1988) – Bailarino
alemão discípulo de Gret Palucca,
Mary Wigman e Marianne Vogelsang.
Dirigiu a Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia (1960-1977).
8 A Ópera de três vinténs, de Bertolt Brecht e Kurt Weill. Dir. de José
Renato, com Marília Pêra, Oswaldo Loureiro, Dulcina,
José Wilker, Paulo Coelho, Maria Ângela Abrass
Vianna, entre outros. Esta montagem inaugurou a temporada teatral da Sala
Cecília Meireles, em 1967, onde até então só eram apresentados concertos de
música.
9 Tatiana Leskova (1922), de família russa e
naturalizada brasileira, impulsionou o balé no Brasil, criando sua própria
companhia, o Ballet Society
e dirigindo o Balé do Teatro Municipal, além de criar seu estúdio em
Copacabana, por onde passaram inúmeras gerações de bailarinos e coreógrafos,
encerrando suas atividades em 2002.
10 O Centro de Pesquisa Corporal
Arte-Educação foi fundado em 1975 por Klauss Vianna,
Angel Vianna e a coreógrafa Thereza D’Aquino. Ao que tudo indica, o nome fora
criado pelo amigo Paulo Afonso Grisolli (1934 - 2004)
jornalista, autor e diretor de teatro e televisão, na época diretor do
Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Rio de
Janeiro (1975-1979).
11 Tais como: o Museu de Arte
Moderna (1971-1972), a Universidade Católica – PUC (1975-1976) e a Fundação
Nacional de Artes - FUNARTE, que financiou o projeto “Significado e função de uma linguagem gestual e sua correlação no
campo da dança” (1977-1978). Klauss Vianna
dirigiu ainda a Escola de Teatro Martins Pena (1976-1978) e o INEARTE -
Instituto Estadual das Escolas de Arte do Rio de Janeiro (1978-1980), ambos no
Rio de Janeiro. Angel Vianna foi titular da Cadeira de Expressão corporal do
Curso de 3º grau em Musicoterapia do Conservatório
Brasileiro de Música (1979-1987).
12 Casa de
Bonecas, de Henrik Ibsen,
dir. Cecil Thiré, com Tônia Carrero, Rubens de Falco e Rosita Tomás Lopes, entre
outros. Estreou em 07 de outubro de 1971, no Teatro Gláucio Gill, no Rio de
Janeiro.
13 O Título Notório Saber – foi concedido em 2003, pelo Conselho de
Ensino, Pesquisa e Extensão da UFBA – Universidade Federal da Bahia,
fundamentando-se na constatação da relevância inconteste de atuação
profissional e acadêmica de Angel Vianna. Grande área: Lingüística, Letras e
Artes / Área: Artes / Subárea: Dança. Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/8987716748353174>.
14 A estrutura do curso é composta pelo ensino de: ballet clássico, dança contemporânea, expressão corporal
(conscientização do movimento), anatomia, fisiologia e cinesiologia,
técnica teatral, música, história da dança, composição coreográfica, malabares, performance, prática de montagem e estágio
profissional (didática do ensino da dança), totalizando uma carga horária de
1.460 h.
15 Tais como: Técnica de
Alexander, Feldenkrais, Zen Shiatsu,
Eutonia e Consciência Corporal. E mais: anatomia,
fisiologia, cinesiologia e biomecânica, danças
populares, improvisação e dança, corporeidade na dança – o método Angel Vianna
e seminário de pesquisa em arte e educação.
16 Como a Staccato Cia de
Dança, a Alexandre Franco Dança-Teatro, a Trupe do Passo, a Pulsar Cia de
Dança, os coreógrafos Henrique Schuller, Paulo Mantuano, Esther Weitzman,
Gustavo Ciríaco, Frederico Paredes, Márcia Rubin,
Marcela Levi, entre outros.
17 Graciela Figueroa (1944). Aprimorou-se nas escolas de Martha Graham, Juilliard School e Merce Cunningham, em NY. Dançou
nas companhias de Lucas Hoving e Twyla
Tharp (NY). Em 1975 trabalha no Brasil, coreografando para o grupo Transforma (BH),
criado por uma discípula e amiga dos Vianna, Marilena Martins. Trabalhou
como bailarina, professora e coreógrafa do Centro de Pesquisa Corporal Arte
e Educação, integrando o grupo Teatro do Movimento (1976-80) e
fundou o grupo Coringa (1977-85). Dirige atualmente o Espacio
de Desarollo Armónico,
em Montevidéo.
18 O grupo Teatro do Movimento (batizado pelo coreógrafo Oscar Arraiz)
é oriundo do Grupo Brincadeiras (1975), e reunia um amplo elenco de
profissionais de várias áreas da dança, que se apresentaram no evento Pacote
Cultural - programa de circulação de espetáculos da Secretária da Cultura do
Rio de Janeiro. O Teatro do Movimento é um dos grupos pioneiros da dança contemporânea
no Rio de Janeiro, na época denominada dança moderna, por onde passaram vários
nomes que mais tarde despontariam na cena nacional.
19 Como os professores Paulo Caldas, Maria
Alice Poppe, Alexandre Franco, Márcia Rubin, Soraia
Jorge, Frederico Paredes, Gustavo Ciríaco, Cláudia
Mele, Paulo Trajano, Luciana Bicalho, Letícia
Teixeira, Márcia Amaral e Esther Weitzman, só para
citar alguns.
20 Alguns profissionais que trabalham neste sentido são,
entre outros: Tereza Feitosa, Ilka Nazaré, Márcia Galiez,
Rita Lupi, Terezinha Belmonte, Beth Maia, Teresa Taquechel, Márcia Abreu, Márcia Feijó, Marta Perez, Marta Bolshaw, Regina Osório, Mônica Ruiz, Liseclair
Pereira e Marcia Barçante.
21 O trabalho corporal desenvolvido por Angel Vianna é denominado hoje
“Conscientização do Movimento”. Busca proporcionar maior conhecimento do corpo
através da percepção das estruturas óssea e muscular, relacionado à
funcionalidade das articulações. Seu processo pedagógico combina movimentos
dirigidos com improvisação.
22 São eles: o curso de bacharelado da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ); o curso de licenciatura do Centro Universitário da Cidade (UniverCidade) e os cursos de bacharelado e
licenciatura da Faculdade Angel Vianna (FAV).
23 Entre as disciplinas podemos citar: balé clássico, dança contemporânea,
pilates, improvisação e expressão corporal, composição coreográfica, anatomia, fisiologia e cinesiologia aplicados à dança, prevenção e lesões orto-músculo-articulares.
24 O Laboratório de Encenação e Multimídia
articula cursos de: dança, temporalidade e história; estética e semiótica
da dança; dança e multimídia; elementos cênicos para a dança; expressão teatral
e dança; análise e percepção musical;
estruturas rítmicas, sonoras e expressão vocal; prática de montagem; formas
cênicas do imaginário popular brasileiro e aprimoramento técnico.
25 O Laboratório de Didática e Pesquisa agrega
as disciplinas de: psicologia do desenvolvimento; experiência do ensino da
dança; metodologia do ensino da dança; estágios supervisionados; estrutura e
funcionamento do ensino; teoria do conhecimento; introdução à pesquisa e
formulação de projeto e orientação de monografia.
26 Disponível no endereço: <www.revistadigitalfav.escolaangelvianna.com.br>.
27 Poderíamos citar, entre outras: a Cia Via Pública, a Dobra Cia de
Dança, Cia Cronópios – Investigadores da Poesia, a
Cia Harappa e a Mamulengos
cia de dança-teatro.
28 Anna Halprin (1920) – Bailarina, coreógrafa e
pedagoga norte-americana, que teve contato com pioneiros da dança moderna
norte-americana, tais como: Martha Graham (1894-1991), Doris
Humphrey (1895-1958), Charles Weidman
(1901-75), Hanya Holm
(1893-1992), entre outros. Durante sua formação em dança na University
of Wisconsin (1938-42) Anna entrou em contato com o
arquiteto e futuro marido Lawrence Halprin (1916),
parceiro de projetos artísticos. Atuou como atriz-bailarina em inúmeros
musicais norte-americanos, na década de quarenta. Desenvolveu, em seguida, um
trabalho pedagógico e coreográfico próprios, com procedimentos de performance,
que romperam com o estilo da dança moderna, criando obras de referência. Fundou
com a filha Daria Halprin o Tamalpa
Institut (1978), centro de formação que integra as
áreas da psicologia, terapia corporal, educação pela dança, arte e drama.
29 Françoise e Dominique Dupuy – Bailarinos,
coreógrafos e pedagogos, o casal Dupuy – Françoise
(1925) e Dominique (1930) – é uma referência na dança moderna e contemporânea
na França. Fundadores da companhia Ballets Modernes (1955-1978), foram discípulos da corrente
alemã com Jean Weidt (1904-1992) e da norte-americana
com Jerome Andrews (1908-1992). De formação multidisciplinar, tiveram contato
com técnicas variadas como a mímica corporal dramática, o teatro, a acrobacia,
o balé clássico, a ioga, as artes marciais, e as técnicas somáticas de Mosche Feldenkrais e Jo Pilates. Criaram o RIDC - Les Rencontres Internationales de Danse Contemporaine - escola de formação em dança moderna e
contemporânea em Paris e fundaram, em seguida, o Mas de la
Danse, em Fontvielle (FR).
JOANA
RIBEIRO DA SILVA TAVARES é Professora Recém-Doutora do PPGT/UNIRIO pelo programa PRODOC da
CAPES. Defendeu sua tese de doutorado “Klauss Vianna,
do coreógrafo ao diretor de movimento. Historiografia da Preparação corporal no
Teatro Brasileiro” no mesmo programa em 2007, sob orientação da Profa. Dra. Tania Brandão e co-orientação da Profa. Dra. Angel Vianna,
após completar estágio de doutorado na Universidade de Paris-8 em 2005-06, sob
a supervisão da Profa. Dra. Isabelle Ginot
JOANA RIBEIRO DA SILVA TAVARES, PHD is a researcher and post-doctorate
teacher of the PPGAC/UNIRIO with a PRODOC scholarship from CAPES, a division of
the Brazilian Ministry of Education. Awarded a scholarship for international
exchange, she completed part of her doctorate studies in France (at Université Paris 8) during 2005 and 2006, under supervision
of professor Isabelle Ginot (PhD). She defended her
doctorate thesis in 2007 with support from the same scholarship program, under
the direction of professor Tania Brandão (PhD) and
co-directed by professor Angel Vianna (PhD). The
subject of her thesis was “Klauss Vianna
– from choreographer to movement director. Historiography of
the physical coach in Brazilian theatre”.