O lugar do “outro mundo” na percepção da nacionalidade: cartas e pedidos ao “São Tancredo”
DOI:
https://doi.org/10.9789/2525-3050.2016.v1i1.77-99Keywords:
Morte e santificação de Tancredo Neves, Intercessão dos mortos, Cartas para o além-túmulo, Comunicação com os mortos, Morte e religiosidade popularAbstract
Este artigo analisa cartas e pedidos deixados no túmulo de Tancredo Neves, no cemitério da Igreja de São Francisco de Assis, São João del-Rei, Minas Gerais, nos dias e meses seguintes à sua morte. Por um lado, a documentação é tomada como indício da persistência de aspectos caros às tradições religiosas formadoras da sociedade brasileira, como a crença no papel dos mortos e dos santos como protetores dos vivos, que se relaciona às suas supostas possibilidades de intercessão junto à divindade. Por outro, seu exame permite refletir sobre um modo de dar sentido à nacionalidade, no qual o mundo dos mortos funcionaria como lugar de compensação pelas mazelas vividas cotidianamente por um povo sofrido e injustiçado. Para alguns autores das cartas e pedidos, no outro mundo, Tancredo Neves apenas continuaria a missão patriótica iniciada em vida, seja no que concerne ao restabelecimento da democracia, seja no que diz respeito à melhoria das condições de existência da população.Downloads
References
ANDERSON, Benedict. Comunidades imaginadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. 336 p.
BOUREAU, Alain; REVEL, Jacques. Les corps séparé des rois français. In: JULLIARD, Jacques (dir.). La mort du roi. Essai d'ethnographie politique comparée. Paris: Gallimard, 1999. p. 113-133.
CALAVIA SÁEZ, Oscar. Fantasmas falados: mitos e mortos no campo religioso brasileiro. Campinas: Unicamp, 1996. 216 p.
CATROGA, Fernando. Entre Deuses e Césares. Coimbra: Edições Almedina, 2006. 512 p.
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano. Petrópolis: Vozes, 1994. 351 p.
DAMATTA, Roberto. A morte nas sociedades relacionais: reflexões a partir do caso brasileiro. In: DAMATTA, Roberto. A casa & a rua. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. p. 133-158.
ENDERS, Armelle. Saint Tancredo de l'Espérance. La mort du président Tancredo Neves et la démocratie brésilienne. In: JULLIARD, Jacques (dir.). La mort du roi. Essai d'ethnographie politique comparée. Paris: Gallimard, 1999. p. 327-358.
FASSIN, Éric. Camelot en deuil: John Fitzgerald Kennedy. La mort du roi in démocratie. In: JULLIARD, Jacques (dir.). La mort du roi. Essai d'ethnographie politique comparée. Paris: Gallimard, 1999. p. 293-306.
FERNANDES, Rubem César. Aparecida: nossa rainha, senhora e mãe, sarava! In: SACHS, Viola (org.). Brasil e EUA. Religião e identidade nacional. Rio de Janeiro: Graal, 1988. p. 85-111.
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. Rio de Janeiro: José Olympio, 1980. 574 p.
HERMANN, Jacqueline. História das religiões e das religiosidades. In: CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. (org.). Domínios da história. Rio de Janeiro: Campus, 1997. p. 329-354.
HERMANN, Jacqueline. Religião e política no alvorecer da República: os movimentos de Juazeiro, Canudos e Contestado. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de A. Neves (org.). O tempo do liberalismo excludente. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 121-160.
HERMANN, Jacqueline. Sebastianismo e sedição: os rebeldes do Rodeador na "Cidade do Paraíso Terrestre", Pernambuco - 1817-1820. Tempo, Niterói, v. 6, n. 11, p. 131-142, jul. 2001.
JULLIARD, Jacques (dir.). La mort du roi. Paris: Gallimard, 1999. 362 p.
MAGGIE, Yvonne. Medo do feitiço. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1992. 296 p.
MARCELINO, Douglas Attila. O corpo da Nova República: funerais presidenciais, representação histórica e imaginário político. Rio de Janeiro: FGV, 2015. 488 p.
MARCELINO, Douglas Attila. Funerais de presidentes e cultura política republicana. In: DELGADO, Lucilia de A. Neves; FERREIRA, Marieta de Moraes (org.). História do tempo presente. Rio de Janeiro: FGV, 2014a. p. 194-210.
MARCELINO, Douglas Attila. Cartas à viúva Neves: a dimensão privada da morte presidencial. In: QUADRAT, Samantha Viz (org.). Não foi tempo perdido: os anos 80 em debate. Rio de Janeiro: 7Letras, 2014b. p. 58-81.
MARCÍLIO, Maria Luiza. A morte de nossos ancestrais. In: MARTINS, José de Souza (org.). A morte e os mortos no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1983. p. 61-75.
MELLO E SOUZA, Laura de. O diabo e a Terra de Santa Cruz. São Paulo: Companhia das Letras, 1986. 396 p.
MEYER, Marlyse; MONTES, Maria Lucia. Redescobrindo o Brasil: a festa na política. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1985. 96 p.
OZOUF, Mona. A festa sob a Revolução Francesa. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre (org.). História: novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976. p. 217-231.
RASMUSSEN, Anne. La mort annoncée de François Mitterrand. In: JULLIARD, Jacques (dir.) La mort du roi. Essai d'ethnographie politique comparée. Paris: Gallimard, 1999. p. 61-79.
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX. São Paulo: Companhia das letras, 1991. 360 p.
RODRIGUES, Claudia. Nas fronteiras do Além: a secularização da morte no Rio de Janeiro dos séculos XVIII e XIX. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005. 390 p.
RODRIGUES, Claudia. Lugares dos mortos na Cristandade Ocidental. Revista Brasileira de História das Religiões, Maringá, v. 15, p. 105-129, 2013.
SENNETT, Richard. O declínio do homem público: as tiranias da intimidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. 448 p.
VALENSI, Lucette. Fábulas da memória: a batalha de Alcácer Quibir e o mito do sebastianismo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994. 352 p.
VELHO, Gilberto. Projeto e metamorfose. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. 140 p.
Downloads
Published
How to Cite
Issue
Section
License
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Licença Creative Commons CC BY 4.0