SISTEMA DE INTERNATO E PROBLEMAS DE SAÚDE DAS ALUNAS INTERNAS, NA EEUSP: 1947 A 1954

Autores

  • Genival Fernandes Freitas
  • Magali Hiromi Takashi Universidade de São Paulo

DOI:

https://doi.org/10.9789/2175-5361.2010.v0i0.%25p

Palavras-chave:

enfermagem, história, memória

Resumo

INTRODUÇÃO: A Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EEUSP) manteve o regime de internato nos anos de 1943 a 1973, destacando-se que a influência da Fundação Rockefeller e a política de boa vizinhança, estabelecida entre os governos dos Estados Unidos da América e do Brasil à época, foram marcantes para a sua criação. A Escola de Enfermagem, da Universidade de São Paulo, foi criada pelo Decreto-lei n. 13.040, de 31 de outubro de 1942. Sua história foi minuciosamente narrada por uma das docentes desta Escola, a Professora Dra. Amália Corrêa de Carvalho e publicada em 1980 (CARVALHO, 1980). Segundo essa autora, as aulas tiveram início no dia 2 de janeiro de 1943, sob a direção de Da. Edith de Magalhães Fraenkel, que havia seguido em 1939 para os Estados Unidos e Canadá, por um ano e meio, como bolsista da Fundação Rockefeller para observar e estudar a organização de escolas de enfermagem nesses dois países e preparar-se para o cargo de diretora da nova Escola. A idéia do internato, talvez, seja proveniente das origens da enfermagem pré-nightingaleana, em que os religiosos foram por muito tempo considerados os principais cuidadores, durante a Idade Média. Assim, Oguisso (2007) menciona que “apesar das perseguições que sofria a religião cristã (até século III da era cristã), houve considerável crescimento do fervor religioso. Com isso, muitos cristãos passaram a dedicar sua vida à prática da caridade, o que deu origem a inúmeras congregações religiosas, que atraíam homens e mulheres vocacionadas para cuidar de pobres e doentes em busca da salvação eterna”. O regime de internato, segundo Gomes et al. (2008), foi aos poucos se extinguindo, embora ainda hoje existam escolas funcionando neste regime, pois o país necessitava urgentemente da formação de grande número de enfermeiros, o que impossibilitava essa vida de família e não se justificava pelo fato da maioria residir na cidade da sede da escola. Atualmente, o curso de graduação da EEUSP recebe anualmente cerca de 80 alunos selecionados por meio de concurso vestibular, tendo por finalidade formar bacharéis em enfermagem e enfermeiros com licenciatura.

 

OBJETIVOS: Analisar o contexto sócio-político e ideológico da criação da EEUSP, em 1942; identificar os problemas de saúde prevalentes nas internas no período de 1947 a 1954 e as causas de desistências, desligamentos ou afastamentos das atividades acadêmicas; discutir, por intermédio da história das doenças, os problemas de saúde mais frequentes durante suas vidas acadêmicas.

 

METODOLOGIA: Trata-se de um estudo de natureza histórico-social de abordagem quantitativa, utilizando-se como fontes documentais os relatórios anuais e anotações da primeira Diretora da Escola, Edith de Magalhães Fraenkel, as quais constituem parte do acervo do Centro Histórico Cultural da Enfermagem Ibero-Americana - CHCEIA/EEUSP, além da historiografia relativa à história das doenças no Brasil e da enfermagem e que invocam a trajetória de outras Escolas de Enfermagem no Brasil.

 

RESULTADOS: As principais causas de desistência ou afastamentos das alunas internas, no período estudado, foram: “pouco aproveitamento nos estudos” (33 casos), “desajustadas” (17), “saúde debilitada” (14), “após comissionamento” (9), “reprovação” (20), “doenças em pessoas da família” (6), “falta de base” (4), “para se casarem” (5), “sem explicação” (3) e “outros motivos” (11). Nos relatórios, a maior causa de desistência do curso se deve ao pouco aproveitamento.  A fim de evitar a eliminação de grande número de estudantes por não terem preparo básico suficiente para acompanhar as aulas de ciências básicas, a diretora escreve em seus relatórios que seria de grande proveito que se aplicasse um teste de inteligência no processo de admissão à Escola, pois esta medida evitaria que se mantivessem estudantes durante 6 meses, verificando-se nos exames finais não poderem continuar no curso, devido ao grande número de reprovações. Tal medida visava beneficiar não só às estudantes, como também a própria Escola, pois evitaria desperdício de tempo e dinheiro. O Relatório da Escola de Enfermagem, curiosamente, pontua que o casamento constituiu um fator de desistência para cinco estudantes, o que não significa dizer que elas eram impedidas de casarem-se durante a formação. É compreensível tal situação, considerando-se o fato de que as atividades acadêmicas na Escola de Enfermagem eram intensas, tanto nas aulas teóricas quanto nos estágios, além do fato de viverem em regime de internato nesse período, vivenciando certa disciplina de horários para entrada e saída, etc. Assim, pode-se inferir que essas cinco alunas que desistiram para se casar vivenciaram essas vicissitudes ou limitações do curso ou do regime de internato. Não foi encontrado o relatório referente à turma de 1948, o que dificulta a análise do motivo das desistências dos estudantes deste ano. De acordo com Carvalho (1980), o fato de haver duas turmas da Classe de 1948 se deve do comissionamento das professoras primárias ter sido concedido com muito atraso, quase meio ano, formando-se assim o grupo II da classe de 1948, constituída pelas terceiras e quartas turmas da Escola de Enfermagem. Entretanto, o atual estudo não nos permite desvelar a razão mais profunda de todas essas desistências enumeradas pelo Relatório. As principais doenças, que foram de fundamental importância para o processo de afastamento de boa parte das internas durante o curso de Enfermagem, de uma lista de 106 causas, foram: “resfriado” (1188 dias), “afastamento por Tuberculose (TB)” (231), “dismenorréia” (153), “hepatites” (109) e “problemas gastrointestinais”, tendo o registro quantitativo de apenas 215 dias de afastamento, contabilizados nos relatórios de 1949 a 1954.  Da Edith de Magalhães Fraenkel expunha, nos relatórios referentes aos anos de 1947 e 1948, a necessidade de uma alimentação mais equilibrada e cuidada, necessária para evitar os problemas de distúrbios gástricos contínuos de que se queixavam as estudantes, obrigando-as a faltar a aulas e trabalhos práticos nas enfermarias. A alimentação era preparada na cozinha do Hospital das Clínicas, sendo feita diversas solicitações da diretora da Escola, verba para a construção de uma cozinha na Escola, para diminuir a sobrecarga da cozinha do referido hospital, que na época era insuficiente para atender de modo conveniente o seu próprio serviço. Cabe ressaltar que nas ocorrências de hepatite registradas não havia especificidade do tipo, lembrando que um dos sintomas desta doença é a gastroenterite (Hepatite A, por exemplo). O grande número de casos de Tuberculose (TB) entre as estudantes ocorreu em 1949, o que somou 200 dias de afastamento de estudo. No começo do século, a tuberculose era, possivelmente, a moléstia infecciosa que determinava o maior número de mortes. A melhora das condições de vida no correr do século, segundo Waldman et al. (1995), ocorreu devido à introdução de quimioterapia eficaz e o desenvolvimento subsequente de tecnologias para a operacionalização de programas permitiu o controle da tuberculose no mundo desenvolvido na década de 40. Tem merecido destaque o fato de que a queda contínua da tuberculose nos países industrializados tenha sido interrompida em meados da década de 80 e que venha mesmo elevando-se nos últimos anos. Essa situação está relacionada a um conjunto de fatores, destacando-se, entre eles, a epidemia de AIDS, o aparecimento de cepas multirresistentes de M. tuberculosis e a ampliação, por motivos políticos e econômicos, da migração em direção aos países industrializados.

 

CONCLUSÕES: O estudo possibilitou a (re)construção identitária da referida Escola, valorizando sua contribuição para a capacitação profissional nos cenários nacional e internacional, além de projetar a imagem da enfermeira nela formada.

 

REFERÊNCIAS:

 

Carvalho A. C. Edith de Magalhães Fraenkel. São Paulo, EEUSP, 1992.

 

_______________. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Resumo Histórico – 1942 – 1980. São Paulo: Escola de Enfermagem USP; 1980.

 

GOMES, Maria da Luz Barbosa; SAUTHIER, Marta. A formação moral da estudante de enfermagem. Esc. Anna Nery,  Rio de Janeiro,  v. 12,  n. 2, June  2008 .   Available from . access on  04  Aug.  2010.  doi: 10.1590/S1414-81452008000200002.

 

Oguisso T. Trajetória histórica e legal da enfermagem. São Paulo: Manole; 2007.

Paixão W. História da Enfermagem. Rio de Janeiro: Bruno Buccini; 1969.

Relatório da Escola de Enfermagem da USP – Edith de Magalhães Fraenkel – CHCEIA/EEUSP.

Secaf V.; Costa H. C. B. V. Enfermeiras do Brasil. História das Pioneiras. São Paulo, Martinari, 2007.

Souza Campos P. F.; Oguisso T. A Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo e a (Re)Configuração da

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WALDMAN, E. A.; SILVA, L. J.; MONTEIRO, C. A. Trajetória das doenças infecciosas: da eliminação da poliomielite a reintrodução do cólera. In: Velhos e Novos males da Saúde no Brasil. A evolução do país e suas doenças. (org) Monteiro, C. A. São Paulo, Hucitec / NUPEN / USP, p. 195 – 244, 1995.

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Biografia do Autor

Genival Fernandes Freitas

Departamento de Orientação Profissional - EEUSP

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Publicado

2010-11-09

Como Citar

1.
Freitas GF, Takashi MH. SISTEMA DE INTERNATO E PROBLEMAS DE SAÚDE DAS ALUNAS INTERNAS, NA EEUSP: 1947 A 1954. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online) [Internet]. 9º de novembro de 2010 [citado 22º de dezembro de 2024];. Disponível em: https://seer.unirio.br/cuidadofundamental/article/view/876

Edição

Seção

Revisão Sistemática de Literatura

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