COMUNICAÇÃO NÃO-VERBAL E O CORPO TRANSFORMADO: CONVIVÊNCIA COM O CATETER DE DIÁLISE PERITONEAL

Autores

  • Doris de Oliveira Araújo Cruz Hospital Universitário ClementinoFraga Filho-UFRJ
  • Sílvia Teresa Carvalho de Araújo Escola de Enfermagem Anna Nery-UFRJ

DOI:

https://doi.org/10.9789/2175-5361.2010.v0i0.%25p

Palavras-chave:

Enfermagem, comunicação, percepção

Resumo

Dóris de Oliveira Araújo Cruz; Sílvia Teresa Carvalho de Araújo

DESCRITORES: Enfermagem; comunicação; percepção.

INTRODUÇÃO: pesquisa com abordagem qualitativa emerge da convivência com clientes com necessidades especiais de saúde na área renal em diálise peritoneal, de sua realidade, diante a condição de saúde, por vezes verbalizadas, outras não. Este estudo trata da comunicação não-verbal e a convivência com o cateter de diálise peritoneal no corpo transformado. No universo humano do corpo sensível do mundo imediato – ações sensações, em que os gestos mais “naturais”, são protagonizados pelas normas do coletivo, sobressaindo conseqüências exteriorizadas sobre a imagem corporal. Um corpo cujo invólucro representa sentimentos e sensações subjetivas, que também variam de acordo com sua cultura e o período temporal.  Esboça-se daí o objeto do estudo: a percepção do cliente e a convivência com o cateter de diálise peritoneal implantado em seu corpo e as formas não-verbais de expressão, com vistas à compreensão do seu universo subjetivo a partir de suas idéias, sensações e representações imaginativas. Apresenta a abordagem sociopoética segundo Gauthier e Santos (1999), cujos passos valorizam a criação artística do coletivo em todas as etapas da produção de um grupo pesquisador através da liberação da criatividade e do imaginário. Como destaque as concepções teórico-analíticas dos sentidos sociocomunicantes do corpo de Araújo (2000) frente à percepção não-verbal, sendo guiada pelos fundamentos do grupo pesquisador de Freire (2005). Uma reflexão sobre a individualidade que cabe a cada cliente em diálise peritoneal e sobre sua dificuldade em aceitar e conviver com o cateter implantado em seu corpo, numa nova perspectiva, que pelo fato de ser definitiva, cabendo-lhe a responsabilidade de preservá-lo e realizar sua própria diálise. Assim, para alguns clientes, não parece tão claro, e tão evidente, a presença de um “tubinho plástico” como parte acessória ou apêndice de seu corpo, visualizá-lo, percebê-lo e com este conviver e depender como acesso à terapia.                                                 OBJETIVO: identificar por meio dos sentidos corporais formas de comunicação não-verbal acerca das percepções do cliente sobre a convivência com o cateter de diálise peritoneal indicadoras de necessidades de cuidado de enfermagem em nefrologia.                           METODOLOGIA: estudo realizado no período de março de 2005 a dezembro de 2006 que delimita parte da dissertação de mestrado na Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A coleta de dados foi realizada no período de março a maio de 2006, com a participação de 13 clientes do programa de diálise peritoneal ambulatorial, no Serviço de Nefrologia em um Hospital Universitário Federal no Município do Rio de Janeiro, após o parecer favorável nº 167/06 emitido pelo Comitê de Ética e Pesquisa da instituição. Os participantes escolhidos a partir do cadastro ativo do programa de diálise peritoneal ambulatorial manual ou automática, todos portadores de cateter de diálise peritoneal, participaram de dois encontros. Os critérios de exclusão foram: dificuldades de locomoção, acesso a transporte e o estado de saúde física. Foram aplicadas dinâmicas de criação artística em grupos com o emprego do relaxamento corporal, da confecção de desenhos individuais e coletivos, da realização de colagens e da construção de histórias para aflorar a criatividade e o imaginário do grupo.                                       RESULTADOS: estes foram facilitados a emergirem Estes dados foram tratados e distribuídos segundo os sentidos sociocumunicantes de Araújo (2000), nas seguintes sub-categorias:  o bem-estar,  evidenciado pelo maior conforto e domínio da técnica em relação às outras terapias dialíticas, com 43 citações; o mal-estar; provocado pela presença do cateter e da solução de diálise continuamente no abdome e a dificuldade para a execução da técnica de diálise, com 30 citações;  o cuidado manutenção do tratamento dia-a-dia , com 30 citações; a função-cateter/abdome, o cateter posicionado exerce sua função e não representa incômodo, com 29 citações; a negação, que denota a recusa de mostrar e observar o cateter, perfazendo 14 citações; a frustração/tempo, através da restrição da liberdade pelo tratamento, com 10 citações; a esperança, com a união do amor e da persistência à vontade de viver, com 11 citações;   a adaptação, revelada pela exata execução da técnica, como prática inserida no cotidiano, com 09 citações. A realização do estudo transversal recebeu o título de ‘direito e o avesso do cateter’ por ter aplicado a triangulação dos dados entre os sentidos corporais e evidenciou as categorias analíticas de auto-estima e auto-imagem classificadas como o sentido socialmente comunicado. Assim pode-se compreender como este cliente/cidadão se vê e se percebe diante deste contexto, um subsídio para a compreensão do impacto decorrente das alterações do aspecto físico então percebidas, (con)vividas, bem como sua aceitação. Nesta leitura com riqueza de dados subjetivos e objetivos foi demonstrado como a auto-estima e a auto-imagem relacionaram-se aos sentidos corporais. Instituindo-se um marco epistemológico para a assistência de enfermagem em diálise peritoneal ambulatorial, com destaque aos aspectos subjetivos a partir da visão do próprio cliente. A poesia crítica extraída das histórias elaboradas pelo grupo pesquisador com o título de “Vida Que Nós Amamos” sintetizou em categorias teóricas os dados produzidos revelando a esperança como persistência para o dia-a-dia, a adaptação ao tratamento, a relação com a instituição, o cuidado exigido, a negação do cateter e a importância da integração.        CONCLUSÕES: indicam a participação do grupo como sujeito ativo da pesquisa experimentando através do diálogo a chance inédita de expressão livre e criativa de saberes inconscientes, desconhecidos e inesperados. A dimensão do cuidado de enfermagem com a facilitação do espaço terapêutico para o exercício de uma maior participação e a proposta de trabalhar com a criatividade, valorizando a cultura dominada e o instituído. As necessidades de cuidado de enfermagem apontaram para a ausência de orientação inicial (em outra instituição); as longas esperas para medicações injetáveis de rotina e exames laboratoriais; a dificuldade extrema para receber a cicladora automática o que sistematiza a terapia no tratamento durante o sono, liberando o período diurno para as atividades de trabalho, estudo e sociais; o re-implante do cateter inoperante e, a abertura de um espaço coletivo para os clientes expressarem suas dificuldades, realidades e descontração. Informa ser importante que haja o tempo e o espaço para que, devidamente esclarecido sobre o tratamento, o cliente opte pela terapia de diálise que se aproxime do seu estilo de vida. O estudo demonstra, ainda, ser imprescindível não alijar o indivíduo de prazeres e desejos como o deslocamento para viagens, passeios locais e da convivência social, em detrimento do tratamento de longo prazo, o que significa um decreto de prisão permanente. Paralelamente a assistência de enfermagem, há a necessidade de se desenvolver competências direcionadas ao melhor acesso e viabilização das consultas e controles das agendas interdisciplinares. A pesquisa foi pioneira na unidade, e os dados evidenciaram experiências de vida entre clientes através da participação bem como através da leitura não-verbal. Estes apesar de freqüentarem o mesmo espaço institucional, ainda não se conheciam. Este estudo apresenta o corpo como fonte produtora do conhecimento, de forma intuitiva, emocional, sensível, racional e imaginativa e assumindo através do sentido da visão o pensamento. O direcionamento passou a ser emocional onde as barreiras físicas tornam-se menos importantes dado o fato de possuírem-na em graus diferenciados de expressão e comprometimento. O desvelar do imaginário permitiu compreender não somente as imagens armazenadas no consciente, como também a busca das diferentes reações comportamentais que cada cliente apresenta quando se defronta com a doença renal e o tratamento dialítico. REFERÊNCIAS:                                                  ACKERMAN, D. Uma história natural dos sentidos. Tradução de Ana Zelma Campos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1992. 366p.                                         ARAUJO, S. T. C. Os sentidos corporais dos estudantes no aprendizado da comunicação não-verbal na recepção pré-operatória: uma semiologia da expressão através da Sociopoética. 2000. xi, 241 f. Tese (Doutorado) Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2000.                                                                          ______; PORTO, I. S.; SANTOS, I. dos; SANTORO, D. C. 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Biografia do Autor

Doris de Oliveira Araújo Cruz, Hospital Universitário ClementinoFraga Filho-UFRJ

Enfermeira do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho-UFRJ, mestre em Enfermagem Nefrológica, membro  Grupo de Pesquisa Comunicação em Enfermagem Clientes de Alta Complexidade, membro do Núcleo de Pesquisas de Enfermagem Hospitalar da Escola de Enfermagem Anna Nery.

Sílvia Teresa Carvalho de Araújo, Escola de Enfermagem Anna Nery-UFRJ

Enfermeira, Doutora em enfermagem, líder do Grupo de Pesquisa Comunicação em Enfermagem Clientes de Alta Complexidade, membro do Núcleo de Pesquisas de Enfermagem Hospitalar, vice-diretora da Escola de Enfermagem Anna Nery-UFRJ.

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Publicado

2010-10-27

Como Citar

1.
Cruz D de OA, Araújo STC de. COMUNICAÇÃO NÃO-VERBAL E O CORPO TRANSFORMADO: CONVIVÊNCIA COM O CATETER DE DIÁLISE PERITONEAL. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online) [Internet]. 27º de outubro de 2010 [citado 21º de novembro de 2024];. Disponível em: https://seer.unirio.br/cuidadofundamental/article/view/851

Edição

Seção

Revisão Sistemática de Literatura

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