PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS NA ATENÇÃO À SAÚDE NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: A VISÃO DOS GESTORES ACERCA DA UTILIZAÇÃO DA CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA

Autores

  • Juliana Cerqueira UNIRIO
  • Adriana Lemos UNIRIO
  • Jacqueline Carvalho UNIRIO

DOI:

https://doi.org/10.9789/2175-5361.2010.v0i0.%25p

Palavras-chave:

Anticoncepção Pós-coito, Direitos sexuais e reprodutivos, Enfermagem

Resumo

INTRODUÇÃO

Nos anos 1980, foi lançado o documento “Assistência Integral à Saúde da Mulher: Bases de Ação Programática” que serviu de apoio para o Programa de Assistência à Saúde da Mulher (PAISM). Trata-se de um documento histórico que significou uma ruptura com o modelo de atenção materno-infantil até então desenvolvido, com incorporação de ações no âmbito da contracepção e de práticas educativas visando maior autonomia da mulher sobre seu corpo (PEREIRA, 2008). Em 2004 o Ministro da Saúde, lançou a - Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher - Princípios e Diretrizes (BRASIL, 2004). Dentre as ações à saúde da mulher o Ministério da Saúde implantou a utilização da Anticoncepção de Emergência (AE) que é conceituado como um método anticonceptivo que pode evitar a gravidez após a relação sexual. O método, também conhecido por “pílula do dia seguinte”, utiliza compostos hormonais concentrados e por curto período, nos dias seguintes da relação sexual. Diferente de outros métodos anticonceptivos, a AE tem indicação reservada a situações especiais ou de exceção, com o objetivo de prevenir gravidez inoportuna ou indesejada, entre as principais indicações de AE, está relação sexual sem uso de método anticonceptivo, falha conhecida ou presumida do método em uso de rotina, uso inadequado do anticonceptivo e abuso sexual (BRASIL, 2005, p.7).  Nesta perspectiva o Ministério da Saúde em 2005 enviou aos municípios manuais técnicos atualizados de Planejamento Familiar de assistência e para gestores, incluindo a recomendação da orientação ao uso e disponibilização da contracepção de emergência. Criou também programas de capacitação para médicos e enfermeiras da rede básica, de atualização sobre saúde e direitos reprodutivos, a dupla prevenção (integração da prevenção do HIV/aids à contraceptiva) e a ações de enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil (REDECE, 2009).  A publicação “Contracepção de Emergência – perguntas e respostas para profissionais de saúde”, parte da série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivo do Ministério da Saúde, foi formulado com intuito de esclarecer e informar aos profissionais de saúde sobre a importância da divulgação e utilização da AE visto a resistência de setores conservadores da área da saúde que classificam a AE como abortiva, e frente à necessidade de, dentre outros objetivos, a diminuir da incidência da gravidez indesejada e reduzir do abortamento inseguro (BRASIL, 2006). O município do Rio de Janeiro foi um dos que mais avançou na implantação do PAISM, tendo como base seus princípios e diretrizes, sobretudo na preparação do profissional para práticas educativas. Na metade dos anos 2000, a Gerência do Programa da Mulher (GPM) iniciou uma descentralização de suas ações para as Coordenações de Área Programática (CAPs), investindo na capacitação de gestores de CAPs para assumirem por completo (assistência e provimento de insumos) as ações do Programa de Planejamento Familiar (PPF) (PEREIRA, 2008). Para sistematização do planejamento e programação das ações e serviços de saúde, o Município é dividido em dez Coordenações de Áreas Programáticas (CAPs). A atenção à saúde da mulher na perspectiva dos direitos sexuais e reprodutivos como parte dos direitos humanos, já é reconhecido em leis, manuais etc., frente a este panorama é questionado se os profissionais que atuam na gestão do PPF estão informados e sensibilizados para a utilização da AE e se eles consideram o provimento da AE uma medida de promoção/garantia dos direitos sexuais e reprodutivos.

 

OBJETIVOS

A pesquisa tem como objetivo: 1) Traçar um perfil dos gestores da gerência do programa da mulher da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (GPM-SMS/RJ), 2) Identificar através dos relatos dos profissionais, os conhecimentos sobre a AE e sua relação com a promoção/garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, 3) Discutir o papel dos gestores na promoção/garantia dos direitos sexuais e reprodutivos no que tange a contracepção de emergência.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa de caráter descritivo, nos moldes de estudo de caso para poder descrever as características do fenômeno estudado em profundidade (GIL, 2002; TRIVINOS, 1987) e tem na abordagem qualitativa a ferramenta que fundamenta a compreensão das opiniões, dos significados, dos valores e crenças atribuídos pelos informantes sobre o fenômeno analisado (MINAYO, 1992). Foram realizadas oito entrevistas, onde um era representante da GPM, um Coordenador de CAP e os demais Diretores ou Assessores da Divisão de Ações e Programas de Saúde nas CAP da AP2, AP3 e AP5, representando respectivamente as zonas sul, norte e oeste do Município do Rio de Janeiro. O material de análise foi um recorte das entrevistas realizadas no projeto o qual este subprojeto está vinculado. A partir dos dados colhidos, foi levantado um perfil dos entrevistados e para a análise do material foi utilizado à técnica de análise de conteúdo, segundo sua modalidade "temática". A técnica de análise temática "consiste em descobrir os 'núcleos de sentido' que compõem a comunicação e cuja presença, ou freqüência de aparição, podem significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido" (BARDIN, 1979:105). Para tal, foram isoladas das entrevistas as questões referentes à AE e em seguida foi criada categoria, de acordo com as questões que surgiram de forma a permitir a análise e discussão da temática. Cabe esclarecer que esta pesquisa está pautada na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que trata de pesquisa com seres humanos (BRASIL, 2000), e foi aprovada, obtendo o parecer número 111ª/2007 de 06/08/07 do CEP SMS-RJ.

RESULTADOS

No levantamento do perfil dos entrevistados observamos que a média da idade é de aproximadamente trinta e oito anos, sendo a maioria mulher e branca. Apenas uma é solteira. Reside na mesma casa uma média de três pessoas e a renda aproximada em torno dos oito mil reais. Cinco dos oito entrevistados são católicos, sendo dentre eles três praticantes; dos demais um é evangélico, um é espírita e um agnóstico. Do total dos entrevistados, cinco são enfermeiros e três médicos. O tempo de formação profissional entre eles varia de dois a trinta e três anos e o tempo que se encontra no cargo atual varia de três meses a nove anos. Dois oito, três relatam ter tido uma história de aborto provocado de pessoas próximas, porém nenhum relata uma história pessoal de aborto provocado. Quando questionados a respeito do seu entendimento profissional sobre os direitos sexuais e reprodutivos, cinco dos oito tiveram dificuldades em responder. Porém se aproximaram da noção desses direitos quando apontaram o poder de escolha como o principal fator pra esta definição. O acesso aos meios contraceptivos, a orientação e informação foi citada por seis dos entrevistados como uma forma de promoção e garantia dos direitos sexuais e reprodutivos. Foi ressaltado por três deles a importância de não haver atitudes preconceituosas com as usuárias do sistema único de saúde (SUS) e a necessidade de escutá-las. Sobre as questões em específico de AE, surgiu uma categoria: “(Des) informação sobre AE e o (não) acesso para uso”. Nesta categoria, em relação à “(des) informação”, foram apontadas questões diretamente ligadas aos profissionais, tais como: a utilização do método Yuzpe; a distribuição da AE para adolescentes; a disponibilidade do método nas unidades básicas de saúde; a atuação do enfermeiro em relação à AE; e a relação com aborto. Ainda quanto à “(des) informação”, foi citado: a falta de informação dos usuários acerca da AE; a importância de parceria entre profissionais e escolas na educação da população sobre o assunto e; a necessidade de treinamentos com os profissionais, em especial os que lidam diretamente com o acolhimento nas unidades básicas de saúde. Em relação ao (não) acesso surgiram as seguintes questões: falta de profissionais disponíveis nas unidades para realização da distribuição da AE e; baixo índice de prescrição dos profissionais responsáveis de AE. Segundo os relatos, foi possível perceber que há uma lacuna no conhecimento dos gestores do PPF entrevistados quanto às questões referentes à AE, isto implica em uma prática não consonante com as normativas do Ministério da Saúde. Os entrevistados comentam sobre a falta de informação dos usuários sobre a AE, no entanto não se vêem como agentes promotores de informações sobre o tema, embora apontem a necessidade de treinamento dos profissionais para o atendimento às usuárias em relação à AE. A integração entre os profissionais de saúde e as escolas como uma ferramenta de educação em saúde sexual e reprodutiva foi citada apenas por uma entrevistada. Entendemos que esta ação é fundamental e deveria estar incorporada às práticas de atenção em saúde, especialmente às do enfermeiro.

CONCLUSÕES

As questões levantadas nas entrevistas se entrelaçam, correlacionando-se de forma que uma situação afeta outra. Segundo os relatos dos entrevistados, foi possível perceber que há uma lacuna no conhecimento dos gestores do PPF da SMS/RJ quanto às questões referentes à AE. Esta lacuna dificulta o acesso a este método e favorece a violação dos direitos humanos sexuais e reprodutivos de milhares de usuários do Sistema Único de Saúde, direitos estes que são de responsabilidades dos gestores promoverem e garantirem. O treinamento dos profissionais é visto como uma das soluções para este conhecimento incipiente. Abordar temas referentes à AE, bem como os direitos sexuais e reprodutivos como direitos humanos nos cursos de graduação da área de saúde é questão sine qua non para que futuros profissionais que atuarão na assistência estejam mais bem preparados para atender as mulheres que buscam as Unidades Básicas visando obter a AE.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de atenção integrada à saúde da mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004.

______. Direitos Sexuais e reprodutivos: uma prioridade de governo. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2005.

______. Anticoncepção de emergência: perguntas e respostas para profissionais de sáude. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Série F. Comunicação e Educação em Saúde Série Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos - Caderno nº 3 Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2006.

GIL, Antonio C. G. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4º edição. Editora Atlas. 2002

MINAYO, Maria C. de S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 7.ed. São Paulo.

PEREIRA, Adriana, L. Ações educativas em contracepção: Teoria e Prática dos Profissionais de Saúde. 2008. 169f. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.

REDECE. Políticas do Ministério da Saúde Brasileiro para o uso e administração da contracepção de emergência. Rede Brasileira de Promoção de Informação e disponibilização da Contracepção de Emergência. Disponível em <http://www.redece.org.> . Acessado em: 24 mar. 2009.

TRIVIÑOS, Augusto. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987.

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Publicado

2010-10-17

Como Citar

1.
Cerqueira J, Lemos A, Carvalho J. PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS NA ATENÇÃO À SAÚDE NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: A VISÃO DOS GESTORES ACERCA DA UTILIZAÇÃO DA CONTRACEPÇÃO DE EMERGÊNCIA. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online) [Internet]. 17º de outubro de 2010 [citado 22º de dezembro de 2024];. Disponível em: https://seer.unirio.br/cuidadofundamental/article/view/779

Edição

Seção

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